Justiça, Democracia e Externalidades Negativas
Justiça, Democracia e Externalidades Negativas
O Brasileiro quer um salvador da pátria para reprimir os poderosos em seu lugar.
Evita o enfrentamento sistematicamente.
No entanto, essa "delegação" oculta um paradoxo:
Se o salvador vai reprimir os poderosos, quem vai reprimir o salvador?
Só um novo salvador, mais poderoso que o anterior, que precisará de um ainda mais poderoso para reprimi-lo, num ciclo sem fim que terminará numa ditadura.
Na história, a única alternativa efetiva a esse paradoxo é a democracia.
A eleição de representantes com mandatos de duração limitada faz os poderosos promoverem alguma justiça. Mas se os eleitores são coagidos ou mal informados, retorna-se à ditadura.
Por isso, não há justiça sem democracia e não há democracia sem liberdade.
A liberdade garante que o interesse da maioria oprimida será prestigiado, construindo-se uma sociedade mais justa e igualitária. Mas liberdade não é liberalismo econômico. É muito mais. É liberdade de pensamento, de imprensa, de manifestação, de credo, de opção sexual, etc..
Mas acima de tudo, é respeito à liberdade do outro.
Desde o governo FHC, o setor público vem incorporando ideologias baseadas no liberalismo econômico, sem muito sucesso na melhoria da qualidade do serviço público. O custo diminuiu sim, através de metas opressivas, cumpridas sob assédio moral, sem participação nos resultados, ao contrário, com retirada de direitos dos servidores e também pelo subemprego do trabalhador privado, via terceirizações indecentes. Pior: todo esse ganho financeiro obtido nos governos FHC, LULA e Dilma tomou rumos ignorados.
Ou não.
No judiciário, a coisa é pior: a falta de democracia na eleição dos presidentes de tribunal (um cargo de natureza eminentemente administrativa) faz com que os juízes, à medida que sobem, submetam o interesse dos trabalhadores, da instituição e até do público, à sua própria ascensão política na carreira.
Os de 1ª instância já se deram conta do risco da concentração de poder nas instâncias superiores e se articulam para participar do processo eleitoral garantindo suas prerrogativas.
Para os servidores, essa concentração de poder se manifesta na escolha de dirigentes administrativos segundo critérios totalmente discricionários, sem os mínimos requisitos técnicos. Essa falta de critérios técnicos produz ineficiência e incompetência.
E a opressão é a arma truculenta do incompetente para extrair resultados, infligindo doenças e outras externalidades negativas.
Excesso de trabalho, ameaças de remoção, de retirada de gratificações, não pagamento de horas extras, ofensas pessoais, desvios de função, atribuição de tarefas adicionais sem a respectiva remuneração, corte de ponto, perseguição a grevistas, etc., arbitrariedades as mais variadas, são apenas alguns dos exemplos.
Uma empresa pode jogar lixo na rua e lucrar com isso se ninguém ficar sabendo. Mas o poder público deve atender o interesse de todos.
O Governo não pode gerar externalidades negativas.
Por definição, a externalidade é a produção de consequências para os outros, sem responsabilização do autor. A piora de um é a melhora do outro. Mas quando se almeja o interesse de todos, não pode haver externalidades, pois a soma é zero.
Mas o governo brasileiro vive produzindo externalidades, Romeu. Todo dia a gente percebe piora na prestação dos serviços públicos, ao mesmo tempo que são criadas obrigações que antes não existiam, aumentos de impostos, etc., Como isso é possível? Cadê a soma zero?
Pois é. A resposta óbvia a essa pergunta é que ALGUÉM está sendo beneficiado pela criação destas externalidades. Alguém está sendo privilegiado em detrimento da maioria. Quem será?
Se é um programa deliberado, amplamente debatido e negociado, com o qual a maioria da sociedade concorda, estamos diante de uma política pública.
Mas se as transferências de recursos estão ocorrendo de forma sorrateira, sem um debate público onde há manifestação livre de vontades e pensamento, estamos diante de externalidades negativas.
De CORRUPÇÃO, DESVIO DE DINHEIRO PÚBLICO, etc..
Cabe ao Poder Judiciário corrigir esses desvios. Mas ele está preparado?
As manifestações de junho demonstram o grau de ilegitimidade a que chegaram todas as instituições. Os poderosos se locupletam, favorecendo os próprios interesses em detrimento do bem comum. As pessoas não se sentem representadas. Exigem democracia. Em todas as instituições, inclusive no Poder Judiciário.
É preciso dar direito de voto. E não só aos magistrados de 1ª instância, mas também aos servidores, que são os mais prejudicados pelos desmandos e incompetência dos governantes e quem, com seu espírito público, frequentemente suprem a ausência de condições de trabalho com seus próprios meios.